Magazine do Xeque-Mate

sexta-feira, 1 de março de 2013

Saiu a Retrato do Brasil - Edição n° 68 "A GRANDE ARTE DE JOAQUIM BARBOSA"

Xeque - Marcelo Bancalero

Saiu a edição n° 68 da Revista Retrato do Brasil do jornalista Raimundo Pereira que descobriu e  divulgou os ERROS do STF.
E agora Joaquim?
Mais ERROS foram descobertos!
Os absurdos desse julgamento politico já passaram do limite!




Open publication - Free publishing
Acrescento aqui a publicação do amigo Miguel Baia Bargas do Blog Limpinho & Cheiroso


Raimundo Rodrigues Pereira: João Paulo Cunha e a grande arte do ministro Joaquim Barbosa


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Raimundo Rodrigues Pereira, um dos maiores jornalistas brasileiros, argumenta, com fatos, que a condenação de João Paulo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados, foi apressada pelo atual presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa; a publicidade contratada pelo Legislativo foi toda ela executada.
Raimundo Rodrigues Pereira, via O Retrato do Brasil
O diabo mora nos detalhes, é o ditado. Para tentar entender a condenação de João Paulo Cunha e dos dirigentes da agência de publicidade mineira SMP&B por desvio de dinheiro público num contrato de publicidade de R$10,7 milhões assinado pelo então presidente da Câmara dos Deputados e a agência no final de 2003, sugerimos que o leitor comece revendo um curto trecho da 31ª sessão do julgamento da Ação Penal 470 (AP 470) no Supremo Tribunal Federal, no dia 16 de agosto do ano passado. Esse detalhe está perto do final da fala do ministro Joaquim Barbosa, o relator da ação.
Barbosa falara praticamente sozinho durante quase quatro horas. Sua fala fora repetitiva, pesada. Ele apresentou e reapresentou fatos que provariam a justeza de sua condenação. Cunha, o principal acusado, teria cometido quatro crimes: um de corrupção passiva, por ter recebido propina de R$50 mil; outro, de lavagem de dinheiro, por ter tentado ocultar o recebimento dessa vantagem; e dois de peculato: um por ter-se beneficiado de dinheiro público, cerca de R$250 mil da Câmara, por intermédio da contratação de um assessor pessoal, e outro porque teria repassado cerca de R$1,1 milhão, também da Câmara, não para a SMP&B, mas, na verdade, para o PT.
Joaquim_Barbosa54_Joao_Paulo
Os 20 segundos escolhidos pelo repórter estão perto do final da sessão. Podem ser vistos no YouTube: AP 470, 16/8/12, 2/2. É a segunda parte da sessão. Barbosa está cansado, nervoso, como se pode ver nos 11 fotogramas acima tirados desses 20 segundos. Ele vinha lendo pausadamente seu voto – longuíssimo, 159 páginas. Teria provado, como escreveu à página 75 e leu para o plenário, que “o crime” estava “materializado”. Cunha teria desviado a maior parte do dinheiro da Câmara para o PT por ter contratado a agência SMP&B para que não fizesse praticamente nada. Dos quase 11 milhões pagos pela Câmara no contrato, menos de um centésimo seria trabalho feito efetivamente pela agência.
Assista:

O cronômetro no YouTube marca 1h03min10s, ou seja, essa segunda parte da sessão já tem uma hora, três minutos e dez segundos de duração. Aparentemente, então, Barbosa percebe que é preciso destacar também o contraditório, a defesa de Cunha. Cita, nesse sentido, um trecho da conclusão do acórdão 430 do Tribunal de Contas da União (TCU), de 2008: o trabalho efetuado pela agência tem um valor maior, 11,32% do contrato. E, então, de repente, como se percebesse a extensão da diferença entre o que vinha afirmando e o que o TCU diz – 11% é mil vezes 0,01% –, interrompe a leitura, ergue a cabeça, sai do script e, como se falasse diretamente para o espectador da TV Justiça, que transmite a sessão, fala, gesticulando rapidamente com o indicador da mão direita, com a mão inteira e com todo o braço: “Uma secretaria disse uma coisa… o que eu já citei”. Ri rapidamente e conclui: “Foi trocada toda a equipe, que posteriormente diz o contrário.”
Com isso, claramente, o ministro Barbosa tentou passar para o País a tese de que a absolvição de Cunha e da SMP&B pelo TCU fora armada. No entender do repórter, isso é uma insinuação grosseira, sem fundamento. E é pouco provável que Barbosa mantenha esse improviso no acórdão com a sentença a ser publicada, a princípio, até o final deste mês de março. Não foi o TCU que tentou armar a absolvição dos acusados. Foram as artes do ministro que construíram a condenação do STF. Para condenar, Barbosa selecionou, basicamente, informações dos meses após o 6 de junho de 2005, quando foi feita a denúncia do deputado Roberto Jefferson sobre a existência do chamado “mensalão”, e desprezou as principais investigações feitas – das quais a do TCU é apenas uma – que provam exatamente o contrário, isto é, que não houve desvio de dinheiro da Câmara dos Deputados no contrato da Câmara com a SMP&B.
Cunha, um parlamentar com sete mandatos populares – de vereador, deputado federal e estadual –, com uma carreira sem mácula, foi condenado a nove anos e quatro meses de prisão. A SMP&B era até então uma das principais empresas de publicidade do País, com mais de 30 anos de atividades. Foi destruída: em menos de dois meses não tinha mais condições de funcionamento e demitiu todos seus quase 200 funcionários.
A condenação de Cunha por corrupção e o suposto desvio de dinheiro da Câmara, logo na primeira sentença da AP 470, criaram o clima para o que alguns já chamam hoje, como veremos no último capítulo de nossa história, o “mentirão”, um julgamento com condenações por indícios, não por provas. No caso de Cunha foi até pior: ele foi condenado contra as provas. Ele provou que os R$50 mil recebidos eram de um esquema de caixa 2 do PT e apresentou as testemunhas e os recibos de que gastou esse dinheiro com pesquisas eleitorais. Mas a maioria dos juízes preferiu condená-lo pelo que supunha ter acontecido. A ministra Cármen Lúcia, por exemplo, disse que achava que ele tentou esconder o fato de ter recebido os R$50 mil por ter mandado sua esposa, Márcia Regina, receber o dinheiro e tê-lo feito às claras, deixando recibo.
A grande investigação da Câmara
Ela resultou de pedido do próprio João Paulo Cunha. Foi de 2005 a 2011 e concluiu: não houve qualquer desvio de dinheiro público.
Para entender os interesses políticos por trás do escândalo chamado “mensalão”, um episódio a ser revisto, mesmo que rapidamente, é a eleição do pernambucano Severino Cavalcanti, do Partido Progressista (PP), a presidente da Câmara dos Deputados em meados de fevereiro de 2005. Severino ganhou a eleição porque o PT se dividiu e apresentou um candidato dissidente, Virgílio Guimarães (PT/MG), no mesmo pleito. Severino, com 124 votos, e Virgílio, com 117, tinham sido derrotados no primeiro turno pelo candidato oficial do PT, Luiz Eduardo Greenhalgh, que tivera 207 votos. No segundo turno, Severino bateu Greenhalgh por 300 a 195 votos. Virgílio foi o homem que apresentou Marcos Valério, mineiro de Curvelo como ele e diretor financeiro das empresas de publicidade DNA e SMP&B, a Delúbio Soares, o tesoureiro do PT, a quem Valério ajudou na tarefa de obter dinheiro para o partido.
Em nossa história, a candidatura de Virgílio contra o candidato oficial de seu partido serve para ressaltar o fato conhecido de que o PT é formado por várias correntes. O grande apoio a Severino e a baixa votação de Greenhalgh no segundo turno mostram ainda que a já então chamada base aliada estava longe de ser petista. A vitória de Severino, a rigor, foi o fato que puxou o enredo da trama política para um lado: contra o PT e a favor da invenção do “mensalão”. No caso da Câmara, ajudou a criar a historinha contra o ex-presidente da casa. Da assessoria do pernambucano emerge Alexis Souza, o operador na produção do principal documento usado por Barbosa na condenação de Cunha e dos dirigentes da agência SMP&B.
Alexis é um funcionário da Câmara ligado ao PP. Com Severino na presidência, Alexis foi para a chefia da Secretaria de Controle Interno (Secin) da Câmara. Quando Severino renunciou à presidência, sete meses depois, Alexis tornou-se assessor da bancada de deputados do PP. Até meados de fevereiro estava no gabinete da vice-presidência da Câmara, ocupada pelo deputado Eduardo da Fonte, também do PP de Pernambuco, como Severino. Foi lá que Alexis conversou com RB no início de fevereiro. Pouco antes, o repórter desta história tinha revisto, no YouTube, a condenação de Cunha por Barbosa e citou para Alexis o fato de o ministro ter destacado o seu documento na condenação. Aparentemente, Alexis ficou orgulhoso com o reconhecimento, mas pediu para que não fossem registradas as avaliações que fez inicialmente sobre a natureza política do “mensalão”. Sua presença se destaca na história contada a seguir primeiro pelo relatório e depois por seus depoimentos nos autos da grande investigação feita pela Câmara dos Deputados a respeito do contrato SMP&B-Câmara assinado em dezembro de 2003.
A investigação começou com um pedido formal do deputado Cunha a Severino: que a Câmara oficiasse ao Tribunal de Contas da União para ser feita uma investigação do contrato. O pedido foi feito a 7 de julho de 2005, logo que Cunha foi apontado como receptor de dinheiro do chamado Valerioduto e surgiu a tese de que isso fora uma propina para ele aprovar o contrato com a SMP&B. Severino não só encaminhou o pedido ao TCU como deu ordem a Alexis, segundo o próprio repete em seus depoimentos, para realizar uma investigação sobre o caso. E o chefe da Secin a fez, de imediato. Quando, de 25 de julho a 3 de agosto de 2005, o TCU mandou uma equipe da sua Terceira Secretaria de Controle Externo (3ª Secex) à Câmara para uma investigação inicial, Alexis repassou a essa equipe as conclusões a que tinha chegado. O trabalho da 3ª Secex seguiu em frente e foi desembocar no acórdão 430 do TCU, de 2008, que absolve Cunha e a SMP&B. Esse acórdão é o mesmo torpedeado pela diatribe de Barbosa citada no início deste artigo. A investigação e as conclusões do TCU serão examinadas no segundo capítulo de nossa história. Por enquanto, se descreverá a investigação da Câmara, que começa com o relatório de Alexis e é a que o repórter considera mais importante.
O relatório final dessa investigação é de 26 de fevereiro de 2010 e está ao final do oitavo volume de um conjunto de 1.929 páginas. Basicamente, ela se desenvolve em três etapas:
1. a iniciada com o pedido de Cunha, a 7 de julho de 2005, e comandada por Alexis, que produz dois relatórios: um dois meses depois, em setembro, e outro, a seguir, em outubro;
2. a conduzida pelo Núcleo Jurídico da administração da Câmara, entre o final de 2005 e meados de 2006;
3. e a que se passa daí em diante, conduzida por uma Comissão de Sindicância (CS) criada pela direção administrativa da Câmara na época em que era presidente da Casa o deputado Aldo Rebelo (PCdoB/SP).
Como as comissões de sindicância só podem, pelo estatuto da Câmara, funcionar por 30 dias, prorrogáveis por mais 30, a rigor foram nomeadas oito dessas comissões, sempre com o mesmo presidente e praticamente com os mesmos funcionários, o que permite considerá-las uma só.
Em suas conclusões finais, a CS diz que sua investigação consumiu 480 dias de trabalho, descontados os 1.115 dias nos quais os autos tramitaram entre os diversos órgãos interessados, que são: a Comissão de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara, na qual Cunha foi julgado e absolvido; a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Correios, cujo relatório foi publicado no início de 2006 e enviado à Procuradoria Geral da República (PGR); a Polícia Legislativa da Câmara, que fez inquéritos sobre a denúncia de crimes que teriam sido cometidos na apresentação de propostas e na execução dos contratos; a Procuradoria Geral da República, que apresentou a denúncia contra Cunha e outras 39 pessoas do grupo dos chamados “mensaleiros” ao Supremo Tribunal Federal, logo depois do relatório da CPMI; e, finalmente, o próprio STF, por meio do ministro Joaquim Barbosa, que presidiu o inquérito da PGR e, após a aceitação da denúncia pela corte suprema, tornou-se o relator da AP 470.
Não existe a menor dúvida de que a CS foi criada para ajudar a esclarecer a denúncia básica do “mensalão”: a de que o PT usara dinheiro público para realizar seu projeto político pela compra de voto dos parlamentares. E, a esse respeito, também não existe a menor dúvida nas quase 2 mil páginas dos autos: o contrato da Câmara com a SMP&B foi absolutamente legal, os pagamentos à agência estavam de acordo com os termos contratados e todos os trabalhos previstos nele foram realizados.
Não é o que disse e repete Alexis. A primeira parte de seu relatório, entregue a 28 de setembro de 2005, condena completamente a licitação feita durante a gestão de Cunha. Ela não teria um objeto bem definido, não incluiria um indispensável parcelamento de tarefas e teria a participação de empresas com sinais de conluio entre si. A licitação teria sido, ainda, julgada por critérios subjetivos, entre os quais o preconceito da comissão licitante contra uma das concorrentes, a empresa Ogilvy, por ela ter adquirido a Denison Propaganda, vencedora de licitação semelhante realizada em 2001, quando o presidente da Câmara era Aécio Neves (PSDB/MG). No segundo documento, de outubro, Alexis analisa sete de 52 processos de compra de serviços conduzidos pela SMP&B através de tomada de preços entre três fornecedores para cada compra e diz ter encontrado neles inúmeros sinais de irregularidade, entre os quais: a presença de empresas de existência duvidosa; a falsificação de propostas de serviços para simular concorrência; a introdução de elementos estranhos em pesquisa de opinião pública, com perguntas que citavam o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu e o próprio presidente da Câmara, João Paulo Cunha; e, finalmente, a falta de comprovação da veiculação de anúncios em 76 jornais do interior. Nesse segundo documento, Alexis faz também a avaliação que, depois, o ministro Barbosa usaria com, digamos, uma ênfase exagerada. Alexis diz que a SMP&B não tinha feito praticamente nada: 99,9% dos serviços do contrato teriam sido terceirizados. Barbosa multiplicou isso por, como diriam os matemáticos, 10-1 (10 à potência menos 1): em vez de a agência ter feito apenas 0,1%, um décimo por cento dos serviços, teria feito apenas 0,01%, um centésimo por cento dos serviços.
Alexis entregou esse segundo relatório com Severino já fora do comando da Casa, depois da posse de Aldo Rebelo, a 28 de setembro de 2005. Logo a seguir, a revista Época, semanário das Organizações Globo, de 28 de novembro, publica matéria dizendo que Alexis havia entregado, ao novo presidente, carta de renúncia a seu mandato na Secin, que só terminaria em 2006. Seu relatório é, visivelmente, a base da matéria, que diz haver “fraudes e mais fraudes” no contrato em discussão. Tudo indica, no entanto, que Alexis nem chegou a ser efetivamente secretário de Controle Interno da Câmara. O deputado Cunha pretende entrar com um embargo ao acórdão a ser publicado pelo STF com sua condenação, no qual declarará que o relatório de Alexis é nulo de pleno direito porque ele não foi nomeado efetivamente diretor da Secin. Foi indicado para o cargo por Severino, mas a nomeação não se consumou porque necessitava de aprovação dos outros integrantes da mesa da Câmara e isso não ocorreu. E, a despeito de Joaquim Barbosa dizer que o relatório de Alexis era de um colegiado, a investigação da Câmara não conseguiu esclarecer quem elaborou o relatório com ele, embora repetidamente lhe tenha pedido esses nomes. O relatório só tem a assinatura de Alexis, que alega ter sido isso uma decisão sua, para proteger de represálias os demais participantes.
O debate do relatório de Alexis continuou na Câmara após sua saída da Secin. No final de 2006, a Câmara decidiu instalar a CS já citada, que só começou a funcionar meio ano depois, como vimos. Enquanto isso não ocorria, a 9 de novembro, o Núcleo Jurídico da casa encaminhou o relatório de Alexis para os cinco membros da Comissão Especial que havia realizado a licitação do contrato. Num documento assinado por todos os cinco, essa comissão refutou as acusações ponto por ponto. No essencial, disse que o contrato era a cópia melhorada do que havia sido usado pela Câmara para a licitação que acabara resultando na contratação da agência de publicidade Denison em 2001, quando o presidente era o mineiro Aécio Neves. Esse contrato também previa o pagamento, por parte da Câmara, de três tipos de serviços a serem produzidos ou supervisionados pela agência:
1. os de criação própria de peças publicitárias;
2. os de supervisão de serviços de terceiros, que não os de veiculação de publicidade; e
3. os de veiculação de publicidade.
Em relação à criação própria, a Câmara pagaria com base numa tabela de preços do Sindicato das Agências de Propaganda do Distrito Federal, e a SMP&B daria um desconto de 80% sobre o total. Sobre os serviços de terceiros, a agência receberia uma comissão de 5%. Quanto à veiculação de publicidade, dos descontos de 20% normalmente concedidos pelos veículos – tevês, jornais, revistas –, 5% seriam repassados à Câmara pela agência.
Feitas as contas, como faria depois o ministro revisor da AP 470, Ricardo Lewandowski, no julgamento do caso, chega-se à conclusão de que os trabalhos da SMP&B, pelos termos do contrato, valeram: R$948,3 mil pelo serviço de acompanhamento e planejamento da veiculação de publicidade; R$129,5 mil pela comissão devida ao acompanhamento de serviços de terceiros; e R$14,6 mil pelos trabalhos próprios de criação (observe as conclusões de Lewandowski no quadro com sua foto). Por esse detalhamento feito pelo ministro revisor, fica evidente que a conta de Barbosa para chegar ao 0,01% implicou excluir os outros dois rendimentos aos quais a SMP&B tinha direito pelo contrato e considerar apenas os R$14,6 mil. Foi uma contabilidade criativa, digamos, mas não muito honesta. Nos autos estava também, para comparação, o contrato feito antes, em 2001, pela Câmara, ganho pela agência Denison. Como deu um desconto de 100% nos trabalhos próprios, a Denison, pelo critério de Barbosa, não fez absolutamente nada.
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No total, o valor dos serviços da SMP&B, por contrato, é de R$1,09 milhão, ou 11,32% do total de R$10,7 milhões, como dizem Lewandowski e o TCU, e não 0,1%, como diz o relatório de Alexis, nem muito menos 0,01%, como disse Barbosa no seu frenesi acusatório. Os cinco membros da Comissão de Licitação afirmaram também que as eventuais fraudes na apresentação de propostas tinham sido encaminhadas para a Polícia Legislativa da Câmara dos Deputados (PL/CD) e estavam sendo investigadas. A Secretaria de Comunicação Social da Câmara (Secom) tinha sido dirigida na gestão de Cunha por Márcio Araújo, também integrante da Comissão de Licitação e um dos principais responsáveis pelos problemas encontrados na licitação e aplicação do contrato, segundo Alexis. O setor jurídico da Câmara mobilizou, então, a nova direção da Secom, da gestão Rebelo, para responder às acusações de pagamentos feitos indevidamente. Eram várias. Uma se referia a campanha de cerca de R$850 mil com anúncios de promoção das atividades da Câmara em 153 jornais, sendo 76 deles fora das capitais. Esse montante correspondia a 21% do valor total dos anúncios, mas seus comprovantes não tinham sido localizados e constava no relatório de Alexis a suspeita de que fossem falsos. Em meados de janeiro de 2006, no entanto, a nova Secom encontrou a grande maioria das comprovações e ficou faltando apenas uma dúzia delas.
Perto do final de 2006, a CS apresentou seu primeiro relatório. Resumiu toda a história: as alegações do relatório de Alexis, o exame que o então diretor da Secin fez nos contratos de compra de serviços e materiais e das veiculações de publicidade e as primeiras conclusões da 3ª Secex do TCU. E concluiu:
1. quanto à elaboração do edital: “nada” havia de desabonador;
2. quanto ao tipo de licitação, com base na chamada “melhor técnica”, que o relatório de Alexis considerara muito subjetivo: o tipo de melhor técnica, por se tratar de trabalho intelectual, era, de fato, o mais indicado, como já fora na licitação de 2001. Além disso, a SMP&B assumira o menor preço entre os apresentados por mais sete concorrentes;
3. e, quanto à avaliação das propostas de compra de serviços e materiais: “não encontrou nenhuma irregularidade administrativa”. Por fim, a conclusão da CS era que o processo deveria ser encerrado e os autos, arquivados.
A CS deixou aberta, no entanto, a questão da investigação de eventuais fraudes na apresentação de propostas para as compras de serviços e materiais, a despeito de todas as compras e serviços terem sido considerados realmente feitos. Para saber se as propostas falsas existiram e se teriam falseado a concorrência em um conluio de perdedores com ganhadores se deveria constituir uma nova Comissão de Sindicância. Aparentemente, a investigação, do ponto de vista da apuração do “mensalão”, o “crime histórico” do suposto desvio de dinheiro público para o PT, estava encerrada. Restavam malfeitos de detalhe numa concorrência como muitas outras. A apresentação de propostas falsas para simular concorrência não deveria ser tolerada, mas faria parte de outra investigação, menor. Possivelmente, é a aceitação da denúncia do “mensalão” pelo STF, em agosto de 2007, que leva à reinstalação da Comissão de Sindicância por mais seis períodos de dois meses cada, três no mandato de Arlindo Chinaglia (PT/SP) como presidente da Câmara (2007-2008) e mais três no de Michel Temer (2009-2010).
No entanto, como a CS foi praticamente a mesma, como se disse, o que ela faz é basicamente eliminar uma lista de problemas remanescentes, especialmente quanto às fraudes porventura existentes nas propostas perdedoras e os anúncios da campanha da Câmara publicados em jornais do interior cujos comprovantes ainda não tinham sido todos encontrados. Os trabalhos nesse período têm esse sentido e a CS resolve encerrá-los definitivamente no início de 2010, como citado. Faz, então, um balanço final dessas pendências: tinham sido analisados os 40 procedimentos de contratação de compras e serviços, impugnados, de modo geral, pelo relatório de Alexis. Os ganhadores dessas contratações tinham executado todos esses contratos e apresentado as notas fiscais correspondentes. À base de três propostas para cada contratação, eram 119 empresas – uma delas havia apresentado duas propostas. A CS oficia então a todas as 79 empresas perdedoras para saber se realmente tinham apresentado as propostas derrotadas e, assim, confirmar a existência, de fato, de concorrência. Resultado da consulta: 11 empresas não foram localizadas, 24 não mandaram resposta e 44 responderam, das quais 36 confirmaram as propostas em poder da comissão e seis não confirmaram.
Que mais a sindicância da Câmara deveria fazer? Já tinha concluído que a licitação vencida pela SMP&B fora benfeita e os serviços tinham sido executados sem que tivesse havido qualquer desvio de dinheiro público. Do ponto de vista do que deveria ser o objetivo central do STF, provar ou não se houve o famoso “mensalão” – em essência, o desvio de dinheiro público da Câmara para a compra de votos pelo PT –, o caso estava liquidado. A sindicância deveria prosseguir para apurar todos os eventuais malfeitos nas 40 contratações, para descobrir se os seis que negaram ter feito as propostas tinham sido substituídos por falsários e se os 35 que não foram localizados ou não responderam tinham, talvez, algo a esconder? Um exemplo de uma investigação dessas que foi bem longe sem qualquer resultado razoável foi feita num contrato de produção de textos para a Primeira Secretaria da Câmara, na época ocupada pelo deputado Geddel Vieira Lima, vencido pela empresa GLT com uma proposta de R$10 mil mensais e perdido pelas empresas Cogito e Agenda, que apresentaram propostas de R$11 mil e R$11,3 mil mensais, respectivamente.
O diligente Alexis diz, em depoimento de junho de 2008 à PL/CD, que teria sido avisado pelo TCU, logo após o início de sua investigação, de que a proposta da Cogito tinha sido assinada por uma funcionária da Câmara, o que implicaria uma contravenção penal. Afirma ainda que, por esse motivo, ouviu a funcionária e a encaminhou para exame grafotécnico depois de ela negar ter assinado o documento.
Essa investigação prosperou. Foi aberto um inquérito policial pela PL/CD e localizados os dirigentes das três empresas, que se submeteram a exame grafotécnico. Abriu-se também um inquérito na Polícia Federal (PF). Dois de seus agentes foram a Belo Horizonte para ouvir uma funcionária da SMP&B sobre o caso. Nos autos da investigação da Câmara, essa história desaparece depois que o dirigente da GLT, a empresa da proposta vencedora, não comparece para prestar depoimento e apresenta atestado médico creditando sua ausência ao fato de ter-se submetido a operação de catarata. No entender do repórter, quem tentar ir mais longe no esclarecimento de eventuais malfeitos semelhantes, que possam ter existido no contrato SMP&B-Câmara, dizendo que faz isso para esclarecer o “mensalão”, confunde e não esclarece nada. Embora possa até pensar que está combatendo o desvio de dinheiro público para fins políticos escusos, na prática pode mesmo é estar desviando dinheiro público de atividades que poderiam ser concebidas de modo mais sensato.

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